A democratização do melhoramento nos criatórios de Nelore

Na aconchegante varanda dos Rodrigues da Cunha, o patriarca Fausto, Faustinho e Fernando nos recebem com extrema gentileza para uma saudável troca de ideias abordando temas dos mais variados. De fino trato e sempre à frente de seu tempo, a família não dispensa o estafante trabalho de pesagens e medições no tradicional rebanho de Nelore, em São Luís dos Montes Belos. Atualmente, os Rodrigues da Cunha fazem parte de um programa de melhoramento no qual se esmeram para coletar todos dados do rebanho, driblando com picardia as dificuldades que, por vezes, os programas impingem aos rebanhos participantes.

Aos 120, 205, 365, 450 dias de idade, todos os machos do programa de melhoramento são pesados individualmente, avaliados por escores visuais de conformação e, como se não bastasse, a partir da juventude, seus testículos são medidos. Tudo muito “simples”. Bastou cada animal passar pelo leitor de código de barras e parar na balança eletrônica para que o laptop, munido de um programa de gerenciamento de dados específico e já contendo a genealogia completa dos bezerros, registrasse o peso individual.

Introduzir o rebanho em um programa de melhoramento demanda mais que anotações corretas ou um programa gerencial. Nos bastidores das fazendas, o que se encontra são equipes de campo treinadas, uniformizadas com padrão, educadas, com salários acima da média para a categoria, moradias descentes e filhos estudando. Já na produção, observamos pastos bem manejados e, não raro, divididos com cerca elétrica, com cochos de sal cobertos. Ou seja, nota-se que há uma empresa montada para que todo o processo de manejo de lotes contemporâneos ocorra sem falhas, gerando dados fidedignos que serão trabalhados e analisados pelos célebres melhoristas.

Não obstante, tenho me deparado no campo com uma situação que vem se tornando corriqueira: a entrada de neloristas em programas de melhoramento, buscando apenas os Índices Genéticos de seus touros, para serem comercializados a clientes que nem sempre conseguem interpretar os resultados do excelente trabalho destas iniciativas. Quando indago a esses neloristas sobre o uso dos relatórios de valores genéticos de suas vacas para descartar as negativas e assim realizar a seleção propriamente dita, recebo a resposta que se encontram no programa apenas para poder vender seus touros mais caros.

O mercado comprador de touros que tenham índices genéticos cresce exponencialmente, fazendo seu importante papel ao forçar que mais e mais criadores adentrem a esses programas de melhoramento, introduzindo em suas fazendas uma filosofia de trabalho que indiretamente melhora a gestão e a sustentabilidade social dos empregados. Mérito para os programas.

Por outro lado, estima-se que haja um grupo de 3 milhões de vacas registradas ou controladas em criatórios sem as condições supracitadas de manejo para sequer manter um lote de animais criados e recriados juntos, formando um lote contemporâneo até sobre ano, muito menos mão de obra com a instrução necessária para anotar os números corretamente numa simples planilha. Tais criatórios devem ter o direito de saber minimamente quais de seus animais apresentam maior probabilidade de serem superiores e quais deveriam ser descartados por serem geneticamente inferiores.

Não estou aqui, de forma alguma, fazendo apologia contrária aos programas. Muito menos desvalorizando a importância dos Índices Genéticos. No entanto, é preciso ser realista e reconhecer as dificuldades do Brasil campeiro.

Frente a essa dura realidade, fica mais do que claro a relevância da genômica, tecnologia que veio a lume há pouco tempo e que pode ser aplicada a esses rebanhos como ferramenta de auxílio na escolha de animais. Apesar de receber a pecha de “recurso pouco eficiente” para seleção, tal afirmação esvai-se diante da necessidade da maioria dos produtores de touros em garimpar bons animais.

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